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Anúncio do fim

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 1 de janeiro de 2009

Se fossem apenas previsões em sentido estrito, as especulações do cientista político russo Igor Panarin quanto ao futuro dos EUA não mereceriam mais atenção que um palpite de turfista. Mas, exatamente como aquelas de Arnold Toynbee que comentei em outro lugar (http://www.olavodecarvalho.org/semana/080512dc.html), elas não são previsões: são o resumo de um plano já em avançada fase de execução. Nenhum estudioso em seu juízo perfeito se arriscaria a fazer prognósticos tão detalhados com base em puras tendências econômicas gerais. Se Panarin é levado a sério pelo Kremlin, é porque o Kremlin sabe do que ele está falando. Suas profecias só merecem respeito porque preparam aquilo que anunciam. Discuti-las como teoria é divertimento ocioso: ou a elite americana faz algo de prático para frustrá-las, ou trata logo de inventar algum pretexto elegante para relax and enjoy diante da ocupação estrangeira.

Panarin prevê a decomposição dos EUA a partir de 2010, com a subseqüente divisão do território em seis regiões separadas, sob o domínio da China, da Rússia, do México, da União Européia, do Canadá e do Japão (v. http://online.wsj.com/article/SB123051100709638419.html). Não há espaço aqui para analisar cada um desses casos, mas, só para dar dois exemplos, a China, pretendente à posse de toda a costa oeste segundo Panarin, e o México, virtual herdeiro de nove Estados entre a Flórida e o Novo México, já desfrutam, nos EUA, de uma liberdade de ação que nenhuma potência concede usualmente a nações estrangeiras. Vinte e tantos anos de demolição sistemática da indústria americana em favor de seus concorrentes chineses – verdadeiro protecionismo às avessas –, acabaram por fazer do consumidor americano o principal sustentáculo da economia chinesa, transmutando investimentos em débitos e ajuda econômica em ritual de auto-imolação. A política de favorecimento unilateral inaugurada por Richard Nixon e levada à perfeição por Bill Clinton deu enfim o resultado previsível: mais até do que a velha URSS, que só cresceu às dimensões de potência ameaçadora graças ao auxílio recebido dos EUA, a China tornou-se, para usar a expressão clássica de Anthony Sutton, “o melhor inimigo que o dinheiro podia comprar”. Somem-se a isso a tolerância suicida ante a espionagem chinesa, a superioridade da China na produção de armas nanotecnológicas capazes de paralisar a nação adversária em poucas horas (v. as colunas de Lev Navrozov em www.newsmax.com) e, last not least, a hegemonia cultural do anti-americanismo na Califórnia, e verão que Panarin não está tão maluco quanto parece. Quanto ao México, tem o privilégio de fomentar livremente movimentos de secessão em vários Estados do Sul, sob o olhar complacente do governo americano, que, com toda a certeza, se tornará ainda mais complacente na gestão Obama, de vez que o novo presidente apóia e é apoiado por “La Raza”, organização militante que advoga a expulsão dos “gringos” e a ocupação da área pela autoridade mexicana.

Com cáustica ironia, Panarin lembra que em vão o povo americano espera milagres de Barack Obama: os milagres não virão.

Obama é, na verdade, o presidente menos qualificado que já houve para defender a integridade e a soberania dos EUA. Amplamente beneficiado por ajudas estrangeiras ilegais, vulnerável a toda sorte de chantagens pelo seu passado nebuloso, suas ligações comprometedoras e seus documentos falsificados, Obama foi posto no poder por quem sabe que pode destrui-lo com duas cuspidas. E foi posto lá precisamente por isso. Ele está bem protegido de seus inimigos, mas totalmente à mercê de seus protetores. Contra estes, ele não pode defender nem sequer a si próprio, quanto mais ao país inteiro.

Quanto àqueles que festejam antecipadamente o fim dos EUA, talvez não lhes ocorra, por falta de imaginação, a suspeita de que um mundo dominado pela Rússia e pela China não conhecerá outro regime político senão o russo e o chinês.

Não obstante, desejo a todos um Feliz Ano Novo, seja isto lá o que for.

Saindo pela esquerda

Olavo de Carvalho


Diário do Comércio (editorial), 8 de junho de 2006

A descoberta de um depósito de cabeças cortadas, no Iraque, foi noticiada com relativa discrição pela mídia chique de Nova York e Washington e não provocou nenhuma reação indignada de Hillary Clinton, Ted Kennedy, John Kerry, John Murtha e outros autores de protestos apopléticos contra as “violências” cometidas pelos americanos em Abu-Ghraib. Com toda a evidência, a moral politicamente correta considera mais humano cortar uma cabeça do que vestir-lhe uma calcinha.

A apropriação do discurso moralizante pelos adeptos de ideologias amorais e genocidas só poderia levar mesmo à deformação caricatural do próprio sentido da moralidade, culminando na completa inversão dos critérios de julgamento.

Para os que, no meio da confusão psicótica, ainda se conservam capazes de apreender as coisas como são, a nova revelação da crueldade dos terroristas iraquianos leva a duas conclusões incontornáveis: (1) ou o governo constitucional do Iraque, com a ajuda americana, prossegue a luta até a destruição total do inimigo, ou será preciso entregar o país a uma gangue de assassinos de mentalidade incalculavelmente monstruosa; (2) se George W. Bush cometeu erros, invadir o Iraque não foi um deles.

Na verdade, a queda de popularidade do presidente não se deve a nada que possa ter desagradado a elite esquerdista. Deve-se justamente ao fato de que esse mandatário, tão firme e decidido nas ações que empreende no Oriente Médio, é tímido e acomodatício ante as exigências da oposição interna, não hesitando em sacrificar o futuro do seu partido no altar de concessões vexatórias. A mais escandalosa dessas concessões é decerto, o projeto de anistia para doze milhões de imigrantes ilegais, contra a vontade da maioria da população e praticamente a totalidade do eleitorado conservador. O acordo parece tanto mais repugnante porque a proposta de anistia veio justamente de dois inimigos tradicionais do presidente, um democrata, Ted Kennedy, o outro republicano, John McCain.

Depois de uma política de gastos públicos megalômanos que foi uma inversão exata de suas promessas de campanha, a aproximação com Kennedy e McCain parece, aos eleitores de Bush, uma traição intolerável. Se, às vésperas da votação do projeto de anistia, o presidente tenta aplacar a multidão conservadora com a oferta de uma emenda constitucional proibindo os casamentos gays, a multidão não vai se deixar comprar por esse agradinho de improviso: vai aplaudir a proibição e continuar malhando Bush. Os políticos republicanos, que dominam o Senado e a Câmara, sabem que o presidente está vendendo suas cadeiras para a oposição e muitos deles já decidiram que gostam mais de seus postos do que dele. Mas o presidente em pessoa parece ainda não ter entendido que um parlamento com maioria democrata significará quase que inevitavelmente o seu processo de impeachment.

Não é a primeira vez que um presidente americano eleito com plataforma conservadora decepciona seus eleitores e joga sua carreira pela janela em troca de uns sorrisos hipócritas dos  adversários. Richard Nixon entrou na presidência pela direita e saiu pela esquerda. O atual presidente parece inspirado nesse fantasma ilustre. O problema dos republicanos agora é: salvar George W. Bush dele próprio ou salvar-se entregando George W. Bush aos leões.

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